sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

A proteção do subsolo e o direito de propriedade

O conhecido brocardo Cuius est solum, eius est usque ad coelum et ad inferos (latim para "aquele que é o proprietário do solo o possui desde o céu até o centro da terra") vem sofrendo limitações com o passar do tempo.

Há muito já não se aplica o referido princípio romano em toda a sua extensão. Com a evolução do direito, novas noções surgiram para se delimitar a extensão do chamado "direito de propriedade".

Obviamente, o poder do proprietário sobre o solo não se delimita por sua superfície. Há de se estender a uma determinada altura e a uma determinada profundidade, sob pena de se tornar inútil ao proprietário. Daí porque, ainda hoje, se diz que a propriedade do solo abrange a do que lhe está superior e inferior.

Como nos ensina Orlando Gomes, “a rigor, porém, o que se estende verticalmente é o poder do proprietário, seu direito de utilização do bem[1].

Surge, entretanto, dúvida para se determinar o limite desse poder de utilização do espaço que se situa acima e abaixo do solo.

Como bem observou o referido doutrinador, a questão não está “em saber até que altura ou profundidade se estende o poder de praticar atos úteis ou não ao exercício da propriedade, mas em determinar o limite ao seu direito de excluir a intromissão alheia no espaço aéreo ou no subsolo correspondente à área do seu terreno[2].

Conclui-se, com base nesse conceito, que não haverá interesse em impedir que terceiros pratiquem atos a uma determinada altura ou profundidade se não houver resultado prático algum para o proprietário.

E essa definição se aplica tanto para o espaço aéreo quanto para o subsolo.

E o tema voltou a debate em recente decisão do STJ, em discussão que envolvia dois proprietários vizinhos. Ao colocar alguns tirantes de sustentação durante a realização de uma obra em sua propriedade, o dono da obra acabou “invadindo” parte do terreno vizinho e originou uma disputa judicial entre os vizinhos confinantes.

Ocorre, porém, que essa “invasão” se deu a uma profundidade de 4 metros e rendeu grande discussão em torno do direito do proprietário ao subsolo delimitado pelas linhas divisórias da propriedade. O dono da obra teria ou não praticado esbulho ao explorar o subsolo do imóvel vizinho sem qualquer autorização?

Em decisão bem fundamentada, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que não.

Discorrendo sobre o alcance do subsolo de uma propriedade, que fica limitado a uma profundidade útil ao seu aproveitamento, o STJ reconheceu ser ilegítima a pretensão do proprietário que se dizia esbulhado porque uma eventual procedência de sua ação não lhe traria nenhuma utilidade.

Mesmo afastando seu pleito e julgando a ação improcedente, sua propriedade não sofreria limitações e não haveria qualquer interferência ao pleno exercício do direito de propriedade.

Vê-se, dessa forma, que a limitação ao direito de propriedade sobre o espaço aéreo e o subsolo devem ser medidos e analisados com cautela e em observância ao caso concreto, não havendo como fixar limites objetivos ou matemáticos para a questão.

Fonte: STJ: REsp 1233852

Fabio Tadeu Ferreira Guedes é advogado especializado em direito imobiliário e sócio do escritório Junqueira Gomide & Guedes Advogados Associados. fabio@junqueiragomide.com.br
www.junqueiragomide.com.br


[1] Direitos Reais, 12ª Edição, Editora Forense, Rio de Janeiro, 1997, p. 114.
[2] Idem. p. 115.

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