quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Dever de Mitigar os Prejuízos cabe a ambos os contratantes

"As partes contratantes de uma obrigação devem tomar as medidas necessárias e possíveis para que o dano não seja agravado. Desse modo, a parte a que a perda aproveita não pode permanecer deliberadamente inerte diante do dano, pois a sua inércia imporá gravame desnecessário e evitável ao patrimônio da outra, circunstância que infringe os deveres de cooperação e lealdade".

Fundamentando a decisão principalmente no princípio da boa-fé objetiva, o STJ proferiu julgado reputando correta decisão de instância inferior que limitou a indenização a ser recebida por uma das partes contratantes que, mesmo tendo ajuizado uma ação de reintegração de posse dentro do prazo prescricional de seu direito, poderia te-la ajuizado com mais celeridade. Este fato, segundo o STJ, contribuiu para agravar a situação da outra parte contratante, caracterizando inadimplemento contratual de ambas as partes.

Segue abaixo o o voto proferido pelo Ministro Vasco Della Giustina, relator do Recurso Especial de nº 758.517:


Cinge-se a controvérsia em saber se o promitente-vendedor pode ser penalizado pelo retardamento no ajuizamento de ação de reintegração de posse c/c pedido de indenização, sob o fundamento de que a demora da retomada do bem se deu por culpa do credor, em razão da não observância, por parte deste, do princípio da boa-fé objetiva.
O egrégio Tribunal a quo, ao dirimir a lide, assentou que, não obstante o direito do promitente-vendedor à indenização pelo tempo em que o imóvel ficou em estado de não-fruição (período compreendido entre a data do início inadimplemento das prestações contratuais até o cumprimento da medida de reintegração de posse), a extensão da indenização deve ser mitigada (na razão de um ano de ressarcimento), em face da inobservância do princípio da boa-fé objetiva, tendo em vista o ajuizamento tardio da demanda competente, verbis :

[...]
A r. sentença reconheceu o direito da apelante à indenização pela privação do uso do imóvel até dezembro de 1999, mês do abandono da unidade pelo compromissário-comprador de acordo com a MMa. Juíza. Sustenta-se no recurso, entretanto, que não se conhece do momento exato da desocupação, mas que logo seria certo: o recorrido teria de necessariamente colocar o imóvel à disposição da recorrente e que como isso não ocorreu, os prejuízos se estenderam até a sentença que resolveu o contrato de compromisso de compra e venda e ordenou a reintegração da promitente-vendedora na posse do imóvel.
[...]
Ainda, enquanto não reintegrada na posse, a apelante não poderia dispor do imóvel, alugá-lo, por exemplo, o que ele somente veio a conseguir em 10 de fevereiro de 2004 (fls. 88 a 91). Mas neste ponto uma circunstância influi de algum modo. Embora o contratante inadimplente cause danos com o seu comportamento, a contraparte também tem deveres, mesmo sendo vítima de um ato ilícito. Ela não pode concorrer para o agravamento dos prejuízos; tão-logo se inteire do ocorrido, deve, embora sem esforços excepcionais, procurar evitar ao máximo outras repercussões danosas, adotar prontamente as medidas necessárias à proteção dos seus interesses:
[...]
Ao lado do fundamento da boa-fé objetiva, um dos requisitos da própria responsabilidade civil, o nexo de causa e efeito, bastaria para justificar a imputação do agravamento à própria vítima, ao menos nas relações de consumo: a mesma razão que preside a culpa concorrente ou exclusiva da vítima na definição do dever de indenizar está presente no agravamento do dano. Também aqui há um dever de abstenção ou de agir, conforme o caso, para que os danos não desbordem de uma ordem natural atrelada à respectiva causa originária, imputável ao ofensor, mais ainda nas relações de consumo, em que a proteção do consumidor constitui um dos princípios fundamentais no Código do Consumidor e que, como desdobramento, não isente o fornecedor de responsabilidade ainda que o consumidor proceder com culpa [...].
E ao mencionar o documento de fl. 34, a apelante situou o abandono do imóvel em setembro de 2001, ou um pouco antes, cerca de um ano antes do ajuizamento da demanda. Ela também não justificou a demora na propositura da ação de resolução e nem por que não tomou antes a iniciativa de averiguar a situação da unidade (se o apartamento ainda estava ocupado ou não), embora o inadimplemento datasse do ano de 1994 e a última notificação do recorrido de 1998. Uma situação como a dos autos impunha um comportamento mais ativo da promitente-vendedora, principalmente em verificara se o promissário-comprador continuava ou não na posse do imóvel. Embora este não a procurasse ou não a notificasse formalmente para restituir-lhe a posse do apartamento, ela estava adstrita a agir, ou ao menos justificar nos autos a sua inércia, a demora em verificar o imóvel e adotar uma posição de defesa eficiente dos seus interesses e, assim, evitar o agravamento do dano. Se fosse diligente e ajuizasse a demanda prontamente, por certo teria recuperado a posse do imóvel bem antes, e nessa medida, a despeito também da atitude do recorrido, ela concorreu para a não-fruição da unidade por mais tempo. E isso influi decisivamente na determinação da indenização. Como a demora deve ser debitada à apelante, é de se excluir do ressarcimento a privação do uso por um ano, e para o cálculo da indenização dever-se-á considerar a demanda como proposta em 16 de outubro de 2001, por ficção, situando-se, portanto, o termo ad quem da indenização em 10 de fevereiro de 2003 (o que corresponde ao tempo transcorrido entre o ajuizamento da demanda e o cumprimento do mandado de reintegração de posse, 15 meses e 25 dias). [...] (fls. 117 a 122) (grifou-se) (Rel. Juiz Convocado Albino Jacomel Guérios).

Correta a decisão recorrida.
Inicialmente, cumpre destacar que o princípio da boa-fé objetiva contrapõe-se ao ideário patrimonialista e individualista vigente na ordem civil de 1916. Funda-se esta preposição na nova ordem constitucional, em que o princípio da dignidade humana ganha contornos de norma irradiadora e delimitadora de direitos. Desse modo, a boa-fé objetiva constitui a efetivação da proteção da dignidade da pessoa humana nas relações obrigacionais, pois circunscreve os limites éticos das relações patrimoniais entre os contratantes.
A propósito do tema, discorre Nelson Rosenvald:

A dignidade da pessoa humana é simultaneamente valor e princípio, constituindo elemento decisivo na afirmação de qualquer Estado Democrático de Direito, assumindo proporção de cláusula geral, apta a condicional e conformar todo tecido normativo. Cogitando de um sistema aberto, cuja supremacia axiológica é referida pela dignidade da pessoa humana, o Direito Civil e a Constituição manterão intenso vínculo comunicativo, com repercussão material dos princípios que lhes são comuns. Nesta constante travessa, a boa-fé é sentida como a concretização do princípio da dignidade no campo das obrigações.
[...]
Ao abordarmos as relações jurídicas, podemos defini-las em dois níveis: relações afetivas e relações negociais. Naquelas, a dignidade da pessoa humana é concretizada no Direito Civil pela cláusula geral da comunhão plena de vida (art. 1.511 do CC). Já nas relações obrigacionais, o supremo princípio constitucional é concretizado pelas especificações da boa-fé objetiva. Os negócios jurídicos formam a disciplina para a regulação genérica das relações sociais.
O princípio da boa-fé atuará como enquadramento constitucional do Direito das Obrigações, na medida em que a consideração pelos interesses que a parte contrária espera obter de uma dada relação contratual, mais não é que o respeito à dignidade da pessoa humana em atuação no âmbito negocial.
[...]
A boa-fé significa a mais próxima tradução da confiança, que é o esteio de todas as formas de convivência em sociedade. A despatrimonialização do direito privado, representada pela célere opção pelo "ser" sobre o "ter" é legitima tanto pela Constituição Federal como pelo novo Código Civil. Este resgatará a centralidade do direito privado, não mais com uma pretensão de totalidade, mas em um ideal de flexibilidade do sistema, permitindo o constante intercâmbio e reenvio naquilo que há de comum com a Constituição ou outras normas. (ROSENVALD, Nelson; Farias, Cristiano Chaves de. Direito das obrigações . 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pág. 61 e 62).

Assim, a boa-fé objetiva afigura-se como standard ético-jurídico a ser observado pelos contratantes em todas as fases contratuais. Ou seja, durante as diversas etapas do contrato, a conduta das partes deve ser pautada pela probidade, cooperação e lealdade.
Destarte, a boa-fé objetiva é fonte de obrigação que permeia a conduta das partes a influir na maneira em que exercitam os seus direitos, bem como no modo em que se relacionam entre si. Neste rumo, a relação obrigacional deve ser desenvolvida com o escopo de se preservarem os direitos dos contratantes na consecução dos fins avençados, sem que a atuação das partes infrinja os preceitos éticos insertos no ordenamento jurídico.
Com esse entendimento, avulta-se o dever de mitigar o próprio prejuízo, ou, no direito alienígena, duty to mitigate the loss: as partes contratantes da obrigação devem tomar as medidas necessárias e possíveis para que o dano não seja agravado. Desse modo, a parte a que a perda aproveita não pode permanecer deliberadamente inerte diante do dano, pois a sua inércia imporá gravame desnecessário e evitável ao patrimônio da outra, circunstância que infringe os deveres de cooperação e lealdade.
A respeito da aplicabilidade do aludido dever, impende ressaltar a pioneira lição da eminente doutrinadora gaúcha, Véra Maria Jacob de Fradera:

[...]
Já o Código Civil brasileiro de 2002, em seu artigo 422, aproxima-se da idéia do legislador da Convenção de Viena de 1980, ao impor certo comportamento a ambos os contratantes. Assim, segundo o mencionado dispositivo legal, Os contratantes são obrigados a guardar assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé (grifo nosso).
Isto posto, surge a indagação: seria possível o direito privado nacional recepcionar o conceito do duty to mitigate the loss em matéria contratual?
Acreditamos ser possível esta recepção. Antes, porém, necessitamos realizar uma série de indagações, para chegar ao fundamento desta, por ora, apenas mera possibilidade de acolhimento do conceito pela doutrina e pelos tribunais brasileiros. O esforço deve valer a pena, pois inúmeras vezes nos deparamos, na prática do foro com situações em que o credor se mantém inerte face o descumprimento por parte do devedor, cruzando, literalmente, os braços, vendo crescer o prejuízo, sem procurar evitar ou, ao menos, minimizar sua própria perda.
[...]
Não cumprindo o dever de mitigar o próprio prejuízo, o credor poderá sofrer sanções, seja com base na proibição de venire contra factum proprium , seja em razão de ter incidido em abuso de direito, como ocorre em França.
No âmbito do direito brasileiro, existe o recurso à invocação da violação do princípio da boa fé objetiva, cuja natureza de cláusula geral permite um tratamento individualizado de cada caso, a partir de determinados elementos comuns: a prática de uma negligência, por parte do credor, ensejando um dano patrimonial, um comportamento conduzindo a um aumento do prejuízo, configurando, então, uma culpa, vizinha daquela de natureza delitual.
A consideração do dever de mitigar como dever anexo, justificaria, quando violado pelo credor, o pagamento de perdas e danos.
Como se trata de um dever e não de obrigação, contratualmente estipulada, a sua violação corresponde a uma culpa delitual.
[...] (FRADERA, Véra Maria Jacob. Pode o credor ser instado a diminuir o próprio prejuízo? in: Revista trimestral de direito civil. RTDC, v. 5, n.19, jul/set, 2004, pág. 110 e 118).

Vale ressaltar, também, o magistério de Flávio Tartuce:

Conceito também interessante relacionado com o princípio da boa-fé objetiva é a mitigação do próprio prejuízo ou, na expressão inglesa, duty to mitigate the loss. [...]
Exemplificando, no caso de uma locação, haveria um dever por parte do locador de ingressar tão logo seja possível com a competente ação de despejo, não permitindo que a dívida atinja valores excessivos. O mesmo argumento vale para os contratos bancários, não podendo a instituição financeira permanecer inerte, aguardando que, diante da alta taxa de juros previstas no instrumento contratual, a dívida alcance montantes astronômicos.
A título de exemplo de aplicação da tese, vale aqui citar interessante sentença prolatada pelo Juiz de Direito Silas Silva Santos, então magistrado na Comarca de Macaraí, Estado de São Paulo. Em caso envolvendo um contrato de arrendamento rural, o magistrado aplicou o duty to mitigate the loss, para configuração da mora dos arrendatários. Isto porque os arrendantes assumiram o dever de corte de árvores na área locada, dever este não cumprido e invocado pelos arrendatários para fundamentar a exceção do contrato não cumprido. Entretanto, como os arrendatários não utilizaram desse seu direito em momento oportuno, não atenderam ao deverde mitigar a perda. Consta da r. sentença: "Aplicando-se ao caso dos autos o duty to mitigate de loss, tenho para mim que os arrendatários não pautaram suas condutas segundo os ditames da boa-fé objetiva. É que, embora favorecidos pela obrigação de os arrendadores conseguirem autorização para o corte das árvores, os réus não adotaram conduta compatível com o interesse de atenuar o próprio prejuízo, na consideração de que não havia prazo para o cumprimento da famigerada cláusula décima. Por isso é que, uma vez mais, não se dá guarida à tese invocada pelos réus. Por todos esses fundamentos, não vejo como excluir a mora dos arrendatários, cuja purgação sequer foi requerida, sem que para tanto
houvesse qualquer justificativa idônea, já que excluída a viabilidade, in casu, do acolhimento da exceptio non adimpeleti contractus ." (TARTUCE, Flávio. Função social dos contratos : do código de defesa do consumidor ao código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Método, 2007, pág. 209 a 211).

Sobre o tema, importante lembrar a doutrina de Alessandra Cristina Tufvesson
Peixoto:

2. DUTY TO MITIGATE THE LOSS
Vista a relevância da vítima para o estabelecimento da indenização adequada, trato de instituto que vem sendo desenvolvido no direito estrangeiro e que começa a ser estudado no direito brasileiro. Trata-se do duty to mitigate the loss, ou mitigação do prejuízo pelo próprio credor. O fundamento para esse dever está diretamente ligado ao dever de boa-fé que deve existir entre os contratantes e entres os indivíduos, em geral.
Tem-se como conceito de boa-fé o dever de agir, nas relações sociais, de acordo com certos padrões mínimos de conduta socialmente recomendados, de lealdade, correção ou lisura, aos quais correspondem expectativas legítimas das pessoas. (PEIXOTO, Alessandra Cristina Tufvesson. Responsabilidade extracontratual - Algumas considerações sobre a participação da vítima na quantificação da indenização . in: Revista da Emerj, v.11, n.44, 2008, p. 135 e 136).

Consolidando a tese exposta, editou-se o Enunciado n. 169 do Conselho da Justiça Federal, na III Jornada de Direito Civil:

O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo.

Impende destacar, ainda, que a aplicabilidade do referido princípio é vislumbrada no âmbito do processo civil por Fredie Didier Jr.:

Remanesce a dúvida: toda essa construção teórica, criada para o universo do direito privado, pode ser aplicada por extensão ao direito processual?
Certamente que sim.
É lícito conceber a existência de um dever da parte de mitigar o próprio prejuízo, impedindo o crescimento exorbitante da multa, como corolário do princípio da boa-fé processual, cláusula geral prevista no art. 14, II, do CPC.
Como já se disse, o princípio da boa-fé processual é decorrência da expansão do princípio da boa-fé inicialmente pensado no direito privado. Esse princípio implica a proibição do abuso do direito e a possibilidade de ocorrência da supressio , figura, aliás, que é corolário da vedação ao abuso. Se o fundamento do duty to mitigate the loss é o princípio da boa-fé, que rege o direito processual como decorrência do devido processo legal, pode-se perfeitamente admitir a sua existência, a partir de uma conduta processual abusiva, no direito processual brasileiro.
Ao não exercer a pretensão pecuniária em lapso de tempo razoável, deixando que o valor da multa aumente consideravelmente, o autor comporta-se abusivamente, violando o princípio da boa-fé. Esse ilícito processual implica a perda do direito ao valor da multa (supressio ), respectivamente ao período de tempo considerado pelo órgão jurisdicional como determinante para a configuração do abuso de direito. Trata-se, pois,
de mais um ilícito processual caducificante . (DIDIER JR., Fredie. Multa corercitiva, boa-fé processual e supressio : aplicação do duty to mitigate the loss no processo civil. in: Revista de processo. a. 34, 1. 171, maio, 2009, pág. 48).

Da análise do contexto da lide, não se divisa qualquer ilegalidade a ser reparada, porquanto a Corte originária considerou inadimplido o dever de mitigar o próprio prejuízo, oriundo do princípio da boa-fé objetiva.
Conforme noticiado nos autos, o promitente-comprador deixou de efetuar o pagamento das prestações do contrato de compra e venda em 1994, abandonando, posteriormente, o imóvel em setembro de 2001. Contudo o credor só realizou a defesa de seu patrimônio em 17 de outubro de 2002, data do ajuizamento da ação de reintegração de posse c/c pedido de indenização, situação que evidencia o descaso com o prejuízo sofrido, verbis:

[...]
E ao mencionar o documento de fl. 34, a apelante situou o abandono do imóvel em setembro de 2001, ou um pouco antes, cerca de um ano antes do ajuizamento da demanda. Ela também não justificou a demora na propositura da ação de resolução e nem por que não tomou antes a iniciativa de averiguar a situação da unidade (se o apartamento ainda estava ocupado ou não), embora o inadimplemento datasse do ano de 1994 e a última notificação do recorrido de 1998. Uma situação como a dos autos impunha um comportamento mais ativo da promitente-vendedora, principalmente emverificara se o promissário-comprador continuava ou não na posse do imóvel. Embora este não a procurasse ou não a notificasse formalmente
para restituir-lhe a posse do apartamento, ela estava adstrita a agir, ou ao menos justificar nos autos a sua inércia, a demora em verificar o imóvel e adotar uma posição de defesa eficiente dos seus interesses e, assim, evitar o agravamento do dano. Se fosse diligente e ajuizasse a demanda prontamente, por certo teria recuperado a posse do imóvel bem antes, e nessa medida, a despeito também da atitude do recorrido, ela concorreu para a não-fruição da unidade por mais tempo. E isso influi decisivamente na determinação da indenização. [...] (fl. 121).

Desse modo, verifica-se que a recorrente descuidou-se com o seu dever de mitigar o prejuízo sofrido, pois o fato de ter deixado o devedor na posse do imóvel por quase 7 (sete) anos, sem que este cumprisse com o seu dever contratual (pagamento das prestações relativas ao contrato de compra e venda), evidencia a ausência de zelo com o seu patrimônio e o agravamento significativo das perdas, uma vez que a realização mais célere dos atos de defesa possessória diminuiriam a extensão do dano.
Ademais, não prospera o argumento da recorrente de que a demanda foi proposta dentro do prazo prescricional, pois, como já exposto, o não exercício do direito de modo ágil, fere o preceito ético de não impor perdas desnecessárias nas relações contratuais.
Portanto, a conduta da ora recorrente, inegavelmente, viola o princípio da boa-fé objetiva, circunstância que caracteriza inadimplemento contratual a justificar a penalidade imposta pela Corte originária.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.
É como voto.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Taxa de associação, mesmo equiparada a condomínio, não autoriza penhora do bem de família

STJ


Ainda que decisão transitada em julgado contrarie a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e equipare taxa de associação de moradores a condomínio, a obrigação é pessoal e não permite a penhora do bem de família para quitar a dívida. A decisão é da Terceira Turma do STJ.

Para o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a contribuição cobrada pela associação de moradores valorizou os imóveis de todo o bairro e melhorou a qualidade de vida dos habitantes. Assim, mesmo que não fossem associados, os proprietários estariam obrigados a pagar a contribuição, para evitar o enriquecimento ilícito.

Penhora

Essa decisão contraria o entendimento consolidado do STJ, mas transitou em julgado. Em cumprimento de sentença, a dívida apontada foi de mais de R$ 115 mil. Daí a penhora realizada sobre o imóvel dos executados.

Os proprietários, então, impugnaram a execução, alegando o caráter de bem de família do imóvel, que por isso não poderia ser penhorado, além de questionar a própria dívida. O argumento foi acolhido pelo tribunal local, o que levou a associação a recorrer ao STJ.

Fins condominiais

A associação de moradores alegou que, do ponto de vista finalístico, a dívida teria a mesma natureza jurídica das contribuições condominiais. Como estas não estariam expressamente listadas na lei, a interpretação que autoriza a penhora do imóvel para quitar débitos de condôminos deveria ser também aplicada em relação à dívida dos moradores não associados.

Para a ministra Nancy Andrighi, porém, ainda que equiparáveis na opinião do TJSP, a natureza jurídica das taxas não se confunde. “A possibilidade de cobrança de taxa condominial decorre de lei, e tem, até mesmo por isso, natureza jurídica de dívida propter rem. O fundamento da cobrança de tal contribuição é, entre outros, a existência de áreas comuns, de propriedade de todos os condôminos, que obrigatoriamente devem ser mantidas pela universalidade de proprietários”, afirmou.

Ela ainda apontou que identificar integralmente as duas taxas levaria a impor a terceiros adquirentes dos imóveis, por exemplo, dívidas para as quais não contribuíram, sem autorização legal prévia.

Obrigação pessoal

“Contudo, se o fundamento do direito ao pagamento da taxa de despesas é um direito pessoal, derivado da vedação ao enriquecimento ilícito, não se pode enquadrar a verba no amplo permissivo do artigo 3º, IV, da Lei 8.009/90, que excepciona a impenhorabilidade do bem de família”, esclareceu a ministra.

“A orientação das hipóteses descritas nessa norma é claramente a de excepcionar despesas impositivas, como ocorre nos tributos em geral. Nesse sentido, a despesa condominial, por seu caráter propter rem, aproxima-se de tal natureza, daí a possibilidade de seu enquadramento nesse permissivo legal. A taxa associativa de modo algum carrega essa natureza”, concluiu.

REsp 1324107

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Notícias do Mercado Imobiliário


1 - Governo anuncia medidas de estímulo à construção civil.

O Governo Federal anunciou na terça-feira (04/12) uma série de medidas de estímulo da construção civil. Dentre elas, destacamos a desoneração da folha de pagamento e a redução da alíquota de tributos incidentes sobre o faturamento das empresas que optam pelo Regime Especial de Tributação (RET), que pode ser adotado nas incorporações submetidas ao regime do patrimônio de afetação (art. 31-A e seguintes da Lei Federal 4.591/64).
A desoneração da folha de pagamento permitirá às empresas de construção civil pagar uma contribuição de 2% sobre o faturamento ao invés de uma alíquota de 20% para a previdência social. De acordo com o Governo os empresários do setor contarão com uma diminuição de R$ 2,85 bilhões no valor repassado ao INSS. 
Já a alíquota do Regime Especial de Tributação (RET) passará dos atuais 6%  para 4% sobre o faturamento. 
Embora tais medidas já tenham sido anunciadas, a sua aplicação ainda depende de normatização a ser publicada no Diário Oficial pelo Governo Federal. 

2 - STJ entende ser legal a cobrança de juros antes da entrega das chaves ("juros no pé").

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EREsp nº 670117, entendeu ser legal a previsão contratual, em contrato de venda de unidades futuras, que permite à incorporadora a cobrança de juros remuneratórios mesmo antes da entrega das chaves.  De acordo com o entendimento dos Ministros a cobrança dos chamados juros no pé é perfeitamente legal, pois decorrente de financiamento a prazo concedido pela incorporadora, além de trazer mais transparência na relação com o consumidor que, desde logo, saberá o percentual de juros que incidirá sobre o preço, ao invés desse valor estar simplesmente incluído no custo final do imóvel.
A aplicação da decisão aos contratos futuros deve ser analisada com cautela, mas a decisão poderá ser benéfica às empresas no caso de eventuais processos já em andamento sobre o tema e, ainda, para justificar a legalidade da cobrança de juros pela empresa após a expedição do Habite-se, mas antes da efetiva entrega de chaves aos adquirentes.

3 - Conselho do Tribunal de Justiça de São Paulo decide que não cabe ao registro de imóveis analisar restrições convencionais de loteamento no registro de incorporação imobiliária.

Os registros de incorporação imobiliária em imóveis com restrições convencionais de loteamentos vinham sendo negados pelos Registro de Imóveis do Estado de São Paulo sob o fundamento de que poderiam desrespeitar as normas particulares de construção impostas pelos loteadores. Essa questão era um problema ainda mais grave quando o imóvel, objeto da incorporação, era oriundo de antigo loteamento, no qual as restrições impostas à época pelo loteador já haviam sido superadas pelo natural desenvolvimento das cidades. 
No entanto, em decisão recente e válida para todos os Cartórios, o Conselho Superior da Magistratura pacificou o tema, ao decidir que não cabe aos Oficiais de Registro de Imóveis verificar o atendimento ou não de restrições particulares, devendo fazer o registro de incorporação em tais casos, quando aprovado o projeto. 

4 - Provimento da Corregedoria sobre aprovação de Graprohab.

A Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo expediu o provimento nº 35/2012, relativo ao registro da incorporação imobiliária e Graprohab. Em suma, os Registros de Imóveis não mais deverão exigir certidão de dispensa de aprovação em Graprohab, que obrigava a incorporadora levar o projeto do empreendimento ao Graprohab, ainda que sem exigência legal, apenas para obter a certidão de dispensa de aprovação. O efeito prático será maior agilidade no registro de incorporação imobiliária. 

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

A CEF não responde por vício na execução da obra


DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CEF. AGENTE FINANCEIRO EM SENTIDO ESTRITO. VÍCIO NA OBRA. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM.

A CEF não responde por vício na execução da obra cometido por construtora escolhida pelo mutuário para erguer imóvel dele, nem por vício existente em imóvel pronto voluntariamente adquirido pelo mutuário. A mera circunstância de o contrato de financiamento ser celebrado durante a construção ou no mesmo instrumento do contrato de compra e venda firmado com o vendedor não implica a responsabilidade do agente financeiro pela solidez e perfeição da obra. Isso porque não se cuida de cadeia de fornecedores a ensejar solidariedade, uma vez que as obrigações de construir e de fornecer os recursos para a obra são substancialmente distintas, guardam autonomia, sendo sujeitas a disciplina legal e contratual própria. A instituição financeira só tem responsabilidade pelo cumprimento das obrigações que assume com o mutuário referentes ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, a liberação do empréstimo nas épocas e condições acordadas, tendo por contrapartida a cobrança dos encargos também estipulados no contrato. Com efeito, figurando ela apenas como financiadora, em sentido estrito, não tem responsabilidade sobre a perfeição do trabalho realizado pela construtora escolhida pelo mutuário, não responde pela exatidão dos cálculos e projetos nem, muito menos, pela execução dos serviços desenvolvidos por profissionais não contratados nem remunerados pelo agente financeiro. Ademais, a previsão contratual e regulamentar de fiscalização da obra pela CEF é no sentido de que o empréstimo seja utilizado para os fins descritos no contrato de financiamento, cujo imóvel lhe é dado em garantia hipotecária. Se constatar a existência de fraude, ou seja, que os recursos não estão sendo integralmente empregados na obra, poderá rescindir o contrato de financiamento. Assim, em relação à construtora, a CEF tem o direito e não o dever de fiscalizar. Dessa forma, figurando como mero agente financeiro em sentido estrito, a CEF não possui legitimidade passiva ad causam para responder por eventual defeito de construção da obra financiada. REsp 897.045-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 9/10/2012.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Construtora indeniza casal por não entregar imóvel no prazo

A 21ª Vara Cível da Capital condenou uma construtora a indenizar dois compradores após atraso na entrega de um imóvel. O apartamento faz parte de um condomínio de luxo, localizado na zona sul da capital paulista, construído em desconformidade com a lei de zoneamento local.

Os autores afirmaram que a entrega do imóvel foi prometida para setembro de 2010 e, posteriormente, adiada para agosto de 2011, em razão das obras terem sido embargadas por decisão judicial. Alegaram ainda que, após descumprimento de ambos os prazos, tiveram frustrados seus sonhos de se mudarem para o local e experimentaram danos materiais e morais, devendo ser indenizados.

A construtora sustentou que o atraso na demora é justificável já que as obras foram suspensas por causa de liminar e reiniciadas somente após sua revogação.

Em sua decisão, o juiz Danilo Mansano Barioni, entendeu que o atraso na obra gerou danos materiais aos autores e determinou que a construtora pague o valor do aluguel do casal, a partir de agosto de 2011 até a data efetiva da entrega das chaves. Com relação ao pedido de indenização por danos morais, “a má-fé não foi demonstrada, devendo ser simples a restituição, arbitrada em R$ 10 mil”, disse. 



Processo nº 583.00.2012.133793-0 

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo


"A brevidade é agradável e lisonjeira, além de dar mais resultado. Ganha em cortesia o que perde pela concisão. As coisas boas, se breves, são duplamente boas. Todos sabem que o homem prolixo raramente é inteligente. Diga brevemente e terá bem dito" ("in" A arte da prudência, Baltasar Gracián, ano de 1647). Vistos. ---- e ---- ajuizaram a presente ação de indenização por danos materiais e morais c.c obrigação de fazer contra ----, alegando, em síntese, que adquiriram da ré o ap. 181, do edifício Camburi, bloco 1, do Condomínio Domínio Marajoara, cuja entrega foi prometida para 30/09/2010. O imóvel, porém, não foi entregue, com prorrogações de prazo. A obra foi embargada por decisão proferida nos autos da ação civil pública nº 053.069.012087-9. Houve repactuação prevendo a entrega da obra para 01/08/2011, o que não foi cumprido. Foram frustrados no seu sonho de se mudarem ao badalado empreendimento propagandeado pela ré. Questionam a cobrança da comissão SATI e comissão de corretagem. Afirmam ter experimentado danos materiais e morais, que devem ser indenizados. Requerem a procedência da ação que seja suspensa a incidência da correção monetária sobre o valor das parcelas previstas na cláusula 6 e item 2.2, até a entrega do imóvel, bem como qualquer cobrança de juros e multa das prestações vencidas após agosto de 2011 e condenada a ré ao pagamento de indenização por danos materiais em valor equivalente ao locativo do imóvel, que estimam em R$ 8.000,00, restitiuição do valor de R$ 19.157,88 cobrados a título de corretagem, restituição da SATI, no valor de R$ 3.129,80 e indenização por danos morais que estimam em R$ 30.000,00. Juntaram documentos. A antecipação de tutela foi parcialmente deferida, mas revogada em sede de agravo de instrumento. Citada, a ré apresentou contestação, alegando, em síntese, que o atraso na entrega da obra é justificado, devendo ser considerado, ademais, o prazo de tolerância de 180 dias. As obras foram suspensas em virtude de liminar proferida em ação civil pública, e reiniciadas somente após sua revogação. Mesmo com sentença de procedência da ação civil pública, anulando os alvarás expedidos, decisão esta que está suspensa até julgamento da apelação, deu andamento às obras, por sua conta e risco, demonstrando respeito aos compradores. Mesmo mantido por apensas alguns meses o embargo das obras, estas não foram retomadas automaticamente, ante a escassez de mão de obra e materiais decorrente do aquecimento do mercado imobiliário. Também a partir de agosto de 2011 não pode ser responsabilizada pois embora pronto, a entrega do imóvel depende do julgamento da apelação pelo TJ. Descabido o pedido de suspensão da correção monetária, que é mera recomposição da moeda. Não estão comprovados os danos materiais e morais. Não podem ser restituídas as despesas com corretagem e assessoria técnica, pagos a corretores autônomos e à empresa Seller Consultoria Imobiliária, que os atendeu num stand de vendas e intermediou o negócio. Requer a improcedência dos pedidos. Juntou documentos. Houve réplica. Instadas, as partes se desinteressam pela produção de outras provas. É o relatório. Fundamento e Decido: O processo comporta pronto julgamento, nos termos do art. 330, I, do CPC, observando-se que, instadas, as partes se desinteressaram pela produção de quaisquer provas. O atraso na entrega da obra é induvidoso. O contrato prevê que o apartamento deveria ser entregue em setembro de 2010, com tolerância de 180. Não foi. Como venho decidindo em casos outros, a cláusula que prevê de forma clara e induvidosa a possibilidade de atraso de 180 dias para a entrega da obra, aliás, comum na quase totalidade de contratos como o ora em análise, NÃO É ABUSIVA e nem pode ser ignorada, pois seu conteúdo é de facílima compreensão a qualquer pessoa que saiba ler. Impassível de ser considerada abusiva pela redação, clara e induvidosa, a cláusula também não é descabida se considerados seus motivos determinantes, na medida em que a ré não se obrigou a pagar uma prestação em dinheiro, com valor e termo de vencimento certos, mas, isto sim, a erguer um prédio, e ainda que tal obrigação se insira em seu ramo regular de atividades, impossível um prognóstico exato de conclusão. Aliás, é até por esta previsão que os argumentos comuns de escassez de mão de obra, “fortuitos e forças maiores” a justificar atrasos ainda maiores são reiteradamente rechaçadas, já que absolutamente previsíveis e justificadoras do prazo de carência de 180 dias. Mais que isto seria quebra do equilíbrio contratual. No caso em apreço, porém, tais questões têm sua relevância afastada na exata medida em que os autores concordaram em repactuar o prazo de entrega em aditivo contratual, que a nova data prevista foi agosto de 2011, ou seja, cinco meses depois do próprio vencimento do prazo contratual somado ao período de tolerância. A data a ser considerada, portanto, é agosto de 2011, mas também nela o imóvel não foi entregue. O atraso além esta data não são justificáveis, nem pelos problemas relacionados à pendência do recurso de apelação tirada conta a sentença proferida em ação civil pública que revogou o alvará concedido pela Municipalidade para a construção do empreendimento. Isto porque entraves judiciais relativos a empreendimentos que pôs a venda estão inseridos no espectro do risco inerente à atividade da ré, que deve suportar suas consequências e não pretender repassá-las aos consumidores. A propósito de questão idêntica relacionada ao mesmo empreendimento o Poder Judiciário já se manifestou pela pena do eminente juiz Sidney da Silva Braga, que assim pontificou: “Além da paralisação de três meses não ser proporcional ao atraso de cerca de um ano, o fato é que, independentemente do mérito da questão na ação própria, a paralisação das obras por ordem judicial em razão de discussão acerca da legalidade ou não de alteração, pela ré, do projeto construtivo inicialmente aprovado pelo Município, com expressivo aumento na área total construída, era um risco que agora não pode ser considerado inesperado nem inevitável e no qual a ré incidiu de forma consciente, no exercício de sua atividade empresarial, pela qual responde integralmente, estando descaracterizada a força maior.” (18ª Vara Cível, processo nº 2011.200265-5). Fortuito ou força maior que porventura poderiam ser considerados em benefício da ré seriam terremotos, cataclismas, ataques terroristas, paralisação completa de todos os pedreiros do Brasil, fatores tão improváveis que pudessem escapar da previsão inicial de entrega das obras, generosa previsão, diga-se de passagem, somada ao período de carência de 180 dias, e neste caso especificamente ao prazo esticado pelo aditamento firmado, mas nada disso ocorreu ou foi comprovado. Nada, portanto, conduz à irresponsabilidade da ré, que deve responder pelo atraso na entrega da obra, incontroverso atraso. Inequivocamente experimentaram os autores danos materiais. Em que pese tratar o parágrafo único do art. 944 do Código Civil de gradação de culpa, o que não é o caso em apreço, dito dispositivo legal consagra a possibilidade de valer-se o juiz da equidade para fixar as indenizações, não havendo óbice à sua aplicação analógica no caso específico destes autos. Tivessem os autores a disponibilidade do imóvel no prazo contratual, poderiam dele dispor como melhor lhes aprouvesse, alugando-o, deixando de pagar aluguel, e assim por diante. Justo, então, que a indenização pelo atraso na entrega da obra, à míngua de critério adequado indicado no contrato de adesão, seja correspondente ao valor do locativo do imóvel não entregue por mês de atraso, com juros de mora de 1% ao mês desde o suposto vencimento do aluguel, e correção monetária pela Tabela Prática do TJ a partir da mesma data, o que será fixado em sede de liquidação de sentença. É inequívoco, pois, que a ré deveria ter entregado o empreendimento pronto aos autores em 01 de agosto de 2011, devidos os locativos, pois, a partir desta data, até a efetiva entrega das chaves. Doutra parte, a prática espúria conjunta de construtoras, corretoras, administradoras, imobiliárias e empresas de suposta mediação e assessoria técnica de “empurrar goela abaixo” do consumidor serviços vinculados ao contrato de compra e venda de imóvel não é nova, e vem sendo há muito condenada na jurisprudência, como ilustra o seguinte aresto: “Cobrança de serviços de assessoria técnico-imobiliária (SATI) – Ausência de informação clara e precisa sobe o serviço prestado – Cobrança indevida, conforme o art. 31 do CDC. Restituição do valor e em dobro, conforme o art. 42, parágrafo único, do CDC.” (Ap. 367.321-47-00, 7ª Câm. Dir. Privado, Rel. Des. Elcio Trujillo, J. 11/11/2009). Os autores jamais procurou qualquer corretora, nem tampouco há comprovação de que lhe tenha sido disponibilizado qualquer serviço de assessoria técnico imobiliária (SATI), mas sim a ré. Fecharam o negócio e, entre o calhamaço de documentos que lhes foram apresentados estavam os documentos que dão ar de regularidade formal à contratação dos serviços de corretagem e assessoria técnico-imobiliária, sobre os quais, na prática, não receberam qualquer explicação, orientação, alerta, nada. A restituição dos valores pagos a este título, portanto, se impõe, mas de forma simples, não em dobro como equivocadamente pleiteado. É que ao acolher a Reclamação nº 4.892/PR, relatada pelo Ministro Raul Araújo, restou decidido pelo C. Superior Tribunal de Justiça que "... a repetição em dobro do indébito, prevista no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, não prescinde da demonstração da má-fé do credor." (J. 27/04/2011) No caso dos autos, a má-fé não foi demonstrada, nem se presume, devendo ser simples a restituição. Também entendo caracterizados os danos morais alardeados. É que a aquisição de um imóvel gera expectativas, pauta os planos do presente e motiva a realização de planos futuros, planejamento familiar, etc. Não se trata de relação contratual qualquer, frustrada por circunstâncias irrelevantes e que produz mero descontentamento. Pelo contrário, ante a natureza da avença, do objeto do contrato, ante a irrazoabilidade do atraso perpetrado, inequivocamente sofreram os autores abalo psíquico considerável e, assim, passível de ser indenizado. Assim, levando-se em consideração as circunstâncias do caso concreto, com as repercussões pessoais e sociais, os inconvenientes naturais suportados pelos autores, a frustração de justa expectativa, o grau de culpa da requerida e o seu porte financeiro, bem como o valor do imóvel, fica fixado o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor único, não para cada um dos autores. E para que não paire qualquer dúvida, oportuno assentar que perfilhamos o entendimento externado na Súmula 326, do Colendo STJ, no sentido de que "na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca". Por fim, como observado no v. acórdão do AI que reformou a decisão concessiva da tutela antecipada a correção monetária é devida, pois mera recomposição de perdas. As prestações pendentes deverão ser pagas conforme pactuado, salvo se condicionadas à entrega das chaves (como parcela das chaves), caso em que levarão em conta a efetiva entrega do imóvel. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para condenar a ré a pagar aos autores, a título de danos materiais, o valor correspondente a um mês de aluguel referente ao imóvel objeto de discussão nos autos, a partir de agosto de 2011 até a data da efetiva entrega das chaves, cuja apuração dar-se-á em fase de liquidação de sentença, por pertinente perícia, devendo o valor dos locativos ser corrigido pela Tabela Prática do TJ e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir do mês seguinte (ad exemplum, o locativo de janeiro terá sua primeira correção em fevereiro, e assim por diante). Por fim, condeno a ré a pagar aos autores indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (única), corrigidos monetariamente pela Tabela do Tribunal de Justiça a partir desta data (pois nela o valor foi tido como adequado), acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação, bem como a restituir os valores pagos a título de comissão de corretagem e SATI, de forma simples, corrigidos e acrescidos de juros pelo mesmo critério supra, mas a partir dos respectivos desembolsos. Arcará a ré com as custas e despesas processuais, fixada a verba honorária em 10% sobre o valor total da condenação. P.R.I.C. São Paulo, 15 de agosto de 2012. DANILO MANSANO BARIONI Juiz de Direito

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Adquirente deve pagar aluguel por ocupação de imóvel mesmo que o contrato seja rescindido

COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESCISÃO CONTRATUAL. CULPA DA CONSTRUTORA. PAGAMENTO DE ALUGUÉIS. RECIPROCIDADE DE CLÁUSULAS ENTRE FORNECEDOR E CONSUMIDOR.
A Turma firmou o entendimento de que, no caso de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel ainda que motivada por culpa da construtora – que o entregara fora do prazo e com defeitos –, é devido pelo adquirente (consumidor) o pagamento de aluguéis referente ao período em que ocupou o bem. Segundo afirmou o Min. Relator, a retribuição pelo uso do imóvel está amparada em imperativo legal que veda o enriquecimento sem causa. Embora o descumprimento contratual da construtora acarrete a ela penalidades e perdas e danos a serem compensados, o comprador não está isento de ressarcir os benefícios auferidos durante o período em que usufruiu do imóvel. Decidiu-se, em seguida, ser extensível à construtora a multa moratória prevista – exclusivamente – em desfavor do adquirente no instrumento contratual avençado. Em observância aos princípios gerais do direito, ou pela principiologia adotada no CDC, ou por imperativo de equidade, sustentou-se que deve haver reciprocidade entre as penalidades impostas tanto ao consumidor quanto ao fornecedor. Assim, prevendo o contrato a incidência de multa moratória para o caso de descumprimento contratual por parte do consumidor, a mesma multa deverá incidir em desfavor do fornecedor, caso seja deste a mora ou o inadimplemento. Por fim, consignou-se que não cabe à construtora, vencida na demanda, ressarcir o adquirente dos gastos com o laudo de vistoria confeccionado extrajudicialmente, pois não se trata de despesa “endoprocessual”, ou em razão do processo, afastada, assim, a regra da sucumbência, consoante interpretação sistemática dos arts. 20, § 2º, e 19 do CPC. REsp 955.134-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 16/8/2012.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Responsabilidade dos bancos diante da súmula 479 do STJ


A Segunda Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça publicou recente súmula (479) com os seguintes dizeres: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.

O acontecimento repercutiu fora do universo judiciário, tanto que jornais divulgaram a ocorrência, lembrando O Estado de São Paulo que “Banco também deve responder por fraude”, enquanto a Folha de São Paulo (B4 – Mercado, 30.6.2012) destacou: “STJ diz que responsabilidade de instituições financeiras é gerir contas com segurança”.
O interesse da mídia é típico de assunto que desperta atenção de milhares de pessoas e a própria necessidade de sumular o entendimento incontroverso confirma que a matéria se repete demasiadamente. O enunciado facilita o julgamento dos casos pendentes e evita a discussão inócua sobre o dever que os bancos assumem, independentemente de prova da culpa, de repor os danos que consumidores amargam pela insegurança das atividades bancárias. Ao sentenciar ação similar, o juiz aplica a posição do STJ como razão de decidir e apressa a reparação do prejuízo, homenageando, com esse dinamismo, o ideal de efetividade e de rapidez dos veredictos, tal como determinam os artigos 5º, XXXV e LXXVIII, da Constituição Federal.
Quando se diz responsabilidade objetiva, o recado é direto quanto a não ser possível discutir culpa para satisfazer o lesado. As vítimas de danos injustos reivindicam os seus direitos e, por vezes, não são indenizadas, apesar de seus excelentes fundamentos, e isso acontece porque não se faz prova da culpa do réu, como exigido pelo artigo 333, I, do CPC, nas demandas típicas da responsabilidade subjetiva prevista no art. 186 do CC. Algumas situações, contudo, recebem tratamento diferente e isso se deve a uma revolucionária evolução dos sentidos nessa área do direito, a partir do reconhecimento da desnecessidade de a vítima provar a culpa para obter a reparação do dano em situações em que o exercitar um fato ou o realizar um serviço provocam riscos para os sujeitos que se relacionam aos seus expedientes.
Os bancos foram inseridos no círculo da responsabilidade objetiva e diversas razões conspiram para aceitabilidade do entendimento. Primeiro, o disposto no art. 14 da lei 8.078/90 (CDC) que dispensa a prova da culpa para proteger o consumidor vítima das operações bancárias e, depois, pela própria gestão administrativa das agências, pois mirando atender bem para conquistar ou manter a clientela, finaliza providências planejadas com esse desiderato sem executá-las com o cuidado exigido para a segurança dos envolvidos, direta ou indiretamente. A abertura de conta-corrente com documentos falsos é um exemplo didático do que se escreve aqui e, embora os estelionatários tenham atingido uma performance quase perfeita na apresentação dos documentos exigidos, a conta é aberta com entrega de diversos talonários para aquele que, sem provisão de fundos, sai do banco inundando o comércio de cheques frios emitidos em nome de um terceiro inocente (o titular dos documentos utilizados). Com a devolução das cártulas sem a compensação, duas vertentes nocivas acontecem.
Aqueles que receberam os cheques pela rotina do comércio, como supermercados, donos de lojas etc., assim agiram na expectativa de que fundos existiam para satisfação da obrigação e, frustrados com o carimbo da devolução, poderão exigir dos bancos que liberaram documentos de crédito para estelionatários, a reparação adequada. Afinal, está evidente o nexo de causalidade do dano sofrido e a atividade do banco (art. 403 do CC). Por outro lado, o sujeito que figura como emitente tem, com esse bate e volta dos cheques adulterados, o nome inscrito nos órgãos que cadastram devedores com pendências (inadimplentes e outros) e sofre o que se chama de abalo de crédito, fenômeno social de importância ímpar no mundo dependente de credibilidade e de um cadastro limpo. Essa pessoa que não contribuiu em nada para que se abrisse conta-corrente falsa e se facilitasse o acesso aos talões de cheques, sofre perturbações concretas com essa situação, pois o crédito lhe é abruptamente cortado, inclusive sua conta bancária, o que permanecerá enquanto não solucionar a pendência no SERASA e outros órgãos do gênero. Aos que receberam títulos falsos cabe reparação de dano patrimonial e ao que fica com o nome sujo por tal episódio, deve o banco compensação pelo dano moral (art. 5º, V e X, da CF), sem prejuízo de reparar prejuízos materiais, caso existam.
Quando se obriga o banco pagar essa conta, restaura-se o império da ordem jurídica, impondo a quem causa prejuízo por sua atividade profissional, o dever de restituir e compensar as agruras suportadas. Errado e extremamente injusto seria liberar o banco das consequências nocivas da abertura de conta-corrente com documentos falsos, sendo necessário advertir que esse resultado anormal poderia ocorrer caso obrigasse a vítima a provar a culpa do preposto do banco que abriu a conta-corrente e entregou cheques para um falsário. Daí a grande virtude da súmula 479.
Todavia, não é permitido generalizar e crer que a súmula resolverá todos os problemas que surgem com os bancos e cumpre advertir que o enunciado sumulado foi redigido para situações específicas, competindo ao intérprete conferir os pressupostos de sua incidência para evitar erros. A chave para adequar o enunciado ao caso concreto está na expressão “fortuito interno”, uma modalidade do caso fortuito previsto no art. 393 do CC. O devedor não responde quando o dano é provocado pela própria vítima ou quando não poderia prever e evitar uma ocorrência avassaladora, como um terremoto, rotulado de fortuito externo (fora da empresa). Responderá, contudo, quando o caso, que poderia ser caracterizado como fortuito, decorre da própria empresa ou ao modo com que realiza a atividade que desenvolve para obtenção de lucro. O delito ou a fraude cometida por um terceiro que usa documentos falsificados ou que se apresenta com perfil falso não isenta o banco de pagar o prejuízo porque isso é considerado fortuito interno, isto é, não está incluído o requisito da externidade (estranha à atividade).
Quando o sujeito descobre que seu cartão bancário foi clonado, ou que alguém com técnica criminosa conseguiu copiar os dados e obter a senha, criando um chip que engana o banco, o correntista não poderá sofrer o desfalque da liberação dos créditos e que surgem no extrato de sua fatura. O cliente não utilizou o cartão para compras ou pagamentos, tendo sido vítima de um criminoso que, com sua habilidade, fraudou o sistema de segurança bancário e deu golpes. O banco responderá, na forma da súmula 479, por ser esse típico caso de fortuito interno, ou seja, decorrente da própria atividade e que cabia ao banco evitar. Da mesma forma, aqueles pobres trabalhadores aposentados que são vítimas do golpe do consignado, ou seja, de empréstimos liberados com facilidades devido ao fornecimento do número da conta bancária pela qual recebem os proventos e que são desviados por estelionatários que se beneficiam com os créditos liberados em suas próprias contas, um descuido inexplicável. Os aposentados sofrem os descontos mensais quando nada contrataram e, evidentemente, cuida-se de um fortuito interno.
Os bancos enviam cartões e talonários de cheques e não raro há interceptação criminosa nesse iter, o que permite a ocorrência de golpes que prejudicam os titulares das contas. Trata-se de fortuito interno e cabe ao banco reparar os danos decorrentes da atividade insegura. Não haverá responsabilidade do banco por sequestro relâmpago, porque aí ocorre a externidade que qualifica essa conduta criminosa como imprevisível e inevitável (fortuito externo). O cliente dominado e amedrontado fornece o cartão e dá a senha para o saque, coisa que o banco não poderia evitar. Diferente seria, no entanto, se o sequestro acontecesse dentro da própria agência, porque aí ocorreu falha do dever de vigilância que é inerente ao serviço. Os bancos respondem pela atividade prestada com defeito ou que se realize com pontos vulneráveis para o patrimônio do consumidor, sendo exigido do sujeito que se serve de tais serviços deveres de cuidado com a própria segurança e com a posse dos cartões, talonários e senhas para operações eletrônicas.
Não há consenso sobre como situar, nesse contexto, o crime de roubo praticado, na rua, por criminosos que, sabedores do saque efetuado, perseguem o cliente e o abordam para subtrair o dinheiro que acabara de sacar na agência bancária, um golpe batizado de “saidinha”. Há quem sustente, com boas razões, ter o banco obrigação de proteger o cliente e evitar que criminosos tenham acesso aos movimentos internos, enquanto alguns advogam que o que ocorre na rua escapa da esfera de atuação bancária, sendo caso de polícia ou de responsabilidade do Poder Público. A perfeita solução depende de prova difícil de ser obtida em processos judiciais, isto é, provar que o banco facilitou a empreitada criminosa, negligenciando cuidados básicos como o de impedir que terceiros possam testemunhar as operações dos clientes. Equipar as agências com biombos que isolem o atendimento e proibir a utilização de celulares no interior das agências, como definido por leis municipais que não são inconstitucionais, são providências simples que dificultam a comunicação entre criminosos que estão espreitando as vítimas desavisadas. O instalar câmeras que monitorem a circulação e os gestos de pessoas na saída e no entorno foi eleito como de boa prudência e, evidentemente, em se confirmando que em determinados locais despidos de tais aparatos os roubos se sucedem com larga frequência, o episódio deixa de ser imprevisível e perde a condição de fortuito externo e abre campo para a incidência da súmula 479.
Assaltos que são perpetrados no interior das agências, nos estacionamentos dos bancos ou no hall de entrada em que estão situados os caixas eletrônicos são fortuitos internos e decorrem das atividades exercidas, de modo que é perfeitamente ajustada a incidência da súmula 479 do STJ, para garantir indenização aos prejudicados por tais violências que não foram contidas apesar da segurança institucionalizadas pela lei 7.102/83. O mesmo acontece com o esvaziamento ilícito dos cofres de aluguel, sendo que hipótese emblemática diz respeito a saques que são debitados na conta do consumidor que nega tê-lo realizado e auferido os valores, o que causa uma perplexidade devido a não ser descartada eventual má-fé do cliente. Contudo e porque há verossimilhança na ocorrência de fraudes praticadas por terceiros ou até prepostos inescrupulosos do banco, é de se entender tal hipótese como fortuito interno, competindo ao banco provar que o cliente foi favorecido pelas operações debitadas, sem prejuízo da inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, da lei 8.078/90).
A súmula 479 do STJ veio em boa hora e para acabar com a tentação do pensamento segundo o qual ainda é mais seguro guardar dinheiro debaixo do colchão.
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* Ênio Santarelli Zuliani é desembargador do TJ/SP e professor de Direito Civil



quarta-feira, 1 de agosto de 2012

SATI, o que é isto? Cobrança indevida? Parte II

Como defendemos e já pudemos escrever a respeito (http://civileimobiliario.blogspot.com.br/2011/10/sati-o-que-e-isto-cobranca-indevida.html), a cobrança do "Serviço de Assessoria Técnico Imobiliária" é permitida, mas desde observadas certas regras.

Talvez a principal delas seja a necessidade de esclarecimentos ao cliente sobre o serviço. Muitos adquirentes de imóveis pagam por este serviço e nem sabem que ele "existe". Ficam sabendo dele apenas porque efetuam um pagamento que vem descrito no recibo como "SATI" (ou como "ATIJ"). E só. Não sabem pra que serve nem o que ele oferece.

Por isso, se o vendedor do imóvel não informar precisamente ao comprador que ele está contratando um serviço de assessoria, a cobrança por este serviço será indevida.

É preciso ter ciência plena dos benefícios do serviço pois, sem este conhecimento, o consumidor nem saberá o que pode ou não exigir do prestador do serviço. Se é uma assessoria, pra que ela serve, o que ela envolve e quando estará disponível?

Estas são algumas dúvidas que o adquirente não pode ter ao efetuar o pagamento do "SATI".

Outra regra que deve ser observada é a possibilidade de escolha do cliente sobre a contratação ou não do serviço. O cliente deve ser informado tratar-se de um serviço opcional e não obrigatório. Ou seja, a contratação do "SATI" não pode ser imposta ao adquirente e sim oferecido a ele, que poderá optar por sua contratação ou não. Infelizmente, alguns relatos demonstram a existência de uma certa prática no mercado que impõe ao adquirente do imóvel a obrigação de contratar o "SATI", sob pena de não conseguir finalizar a compra do imóvel. Assim, coagidos, estes adquirentes pagam pelo serviço, mesmo sem ter o desejo de contratá-lo.

Essa imposição evidencia a existência de uma "venda casada", prática vedada e reprimida pelo Código de Defesa do Consumidor.

Se estas regras não forem observadas, cabe ao cliente-adquirente pleitear o seu devido ressarcimento, demonstrando que pagou indevidamente ao vendedor por um serviço que não sabia que estava contratando ou que não teve oportunidade para escolher a sua não contratação.

É o que vários adquirentes estão fazendo. E o Judiciário vem acumulando decisões favoráveis à devolução do montante desembolsado a título de "SATI". Veja-se, por exemplo esta recente decisão proferida por uma das Varas do Juizado Especial Cível da Vergueiro, nos autos do processo nº 0701495-73.2012.8.26.0016:

“Vistos. Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38 da Lei 9099/95. Decido. Cuida-se de ação com escopo de devolução do valor cobrado a título de taxa de assessoria técnico imobiliária e jurídica, com pedido de devolução em dobro e reparação de danos morais sob alegação de que declinou o autor do serviço mas sua recusa não foi acolhida pela ré. Em defesa, a sustentou que houve a contratação de livre e espontânea vontade bem como que os serviços foram prestados haja vista a necessidade do autor de contratação de financiamento imobiliário. Aduziu, também, que não há dever de indenizar porque não foram preenchidos os requisitos legais. É de consumo a relação havida entre a partes de modo que incidem sobre ela as normas do Código de Defesa do Consumidor de sorte que, confirmado o pagamento pela ré, não se alcança constatar a regularidade da cobrança por serviço de assessoria jurídica/técnica imobiliária, ou técnica imobiliária, tal qual se revelou esse cobrado pelo que afirmou a ré. Com efeito, estabelece art. 31 desse Diploma Legal que "a oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores". O art. 30 do mesmo diploma ainda complementa que "toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação, com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado". Note-se que a proposta preenchida pelo autor bem como o contrato celebrado constam dos autos sem que neles se constate a descrição dos serviços a serem prestados e a possibilidade de escolha da sua contratação, ou não, pelo contratante, a fim de que se torne idônea a cobrança em razão de legítima adesão do autor. Tampouco alcançou a ré comprovar o trabalho suportado com o financiamento imobiliário que almejou o autor, sem conseguir rechaçar a afirmação do requerente da ocorrência de venda casada, não lhe socorrendo o ajuste de condutas noticiado pois, do mesmo modo, prevê ele a possibilidade de cobrança, e não, a obrigatoriedade de pagamento para celebração do compromisso de compra e venda, do que não se descrê. Ao contrário, nos autos, à míngua de prova que arrede esse convencimento, evidenciou-se uma provável venda casada, a qual, sabe-se, é vedada pelo ordenamento jurídico que repele contratações de quaisquer operações condicionadas ou vinculadas à realização de outras operações ou a aquisição de outros bens e serviços. Daí porque, nesse cenário, não se reconhece tenha havido o indispensável oferecimento claro e preciso do serviço, discriminado em contrato separado, expostas todas as condições de maneira que o contratante tivesse oportunidade de examiná-las com atenção, sequer a oferta de opção de contratação. Ao menos, não houve nos autos prova de que isso ocorreu de sorte que o valor pago a titulo de serviço de assessoria jurídica/técnica imobiliária deverá ser restituído pela ré ao autor de forma singela, sem aplicação da norma contida no § único do Artigo 42 do CDC porque não configurada a hipótese fática ensejadora. No que toca ao dano moral, é o autor homem adulto, economista, negou-se ao pagamento mas não alcançou dele se desvencilhar, preferindo a celebração do contrato, mesmo convicto da ausência de justa causa para a exigência da ré, o que descortina um dissenso contratual desacompanhado de contornos outros autorizadores da reparação Afinal, já proclamou o Colendo Superior Tribunal de Justiça (RT 798/212, no Resp. 202.564-RJ, relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira) que o "inadimplemento do contrato, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer desconforto ao outro contratante - e normalmente o traz -, trata-se, em princípio, do desconforto a que todos podem estar sujeitos, ela própria vida em sociedade. Com efeito, a dificuldade financeira ou a quebra da expectativa de receber valores contratados não tomam a dimensão de constranger a honra ou a intimidade, ressalvadas situações excepcionais". Preleciona Sérgio Cavalieri Filho na obra "Programa de Responsabilidade Civil", 2a edição, Ed. Malheiros, 1999: "..só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia, desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos...".É esse o sentir que dos autos emana. Posto isso, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação entre as partes para o fim de condenar a ré ao pagamento ao autor de R$ 1.890,00, valor corrigido pelo índice da Tabela Prática do TJSP a partir de o ajuizamento da ação, acrescido de juros de 1% ao mês desde a citação. Sem custas ou honorários advocatícios, na forma do art. 55 da lei 9.099/95".


Fabio Tadeu Ferreira Guedes é advogado e sócio do escritório Junqueira Gomide & Guedes Advogados Associados. 
fabio@junqueiragomide.com.br 
www.junqueiragomide.com.br

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Fuja das férias frustradas


Fuja das férias frustradas.

As férias são sempre momentos especiais de descontração, diversão e descanso. Certo? Nem sempre.
Infelizmente, ficamos sujeitos a diversos percalços que podem nos trazer alguns incômodos. E isso pode acontecer com atrasos em voos ou extravios de bagagens, por exemplo. E há situações que até podem arruinar por completo a tão sonhada e programada viagem de férias.
Essa está sendo a experiência de inúmeros jovens nestas férias de julho. Muitas turmas de amigos adquiriram pacotes para a esperada viagem de formatura, mas não estão tendo a felicidade de conseguir embarcar, mesmo tendo comprado e efetuado o pagamento integral dos pacotes de viagem.
E pior. Alguns até conseguiram embarcar. Mas, já em outro país, foram surpreendidos com a inexistência de reservas em hotéis e passeios, causando desespero aos pais que, daqui do Brasil, pouco podiam fazer para ajuda-los.
E tudo isso aconteceu porque uma conhecida agência de turismo, alegando dificuldades financeiras, não vem honrando com as obrigações assumidas, deixando mais de seis mil clientes sem garantias de viajar.
O risco de passar por uma situação dessas em suas férias pode ser minimizado se você puder pesquisar sobre a agência de turismo antes de adquirir o pacote de viagem. Uma simples pesquisa nos sites de busca da internet pode ser muito valiosa. Em regra, clientes descontentes contam suas insatisfações na internet, com opiniões pessoais sobre o atendimento e a qualidade do serviço prestado. Se a empresa possuir muitas reclamações, pode ser um indício de que algo não anda bem.
Outra forma de saber se a empresa vem cumprindo os pacotes que vende, é fazer uma pesquisa no site dos Tribunais de Justiça (o site do Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, é http://www.tjsp.jus.br/). Se a empresa possuir muitas ações judicias, é sinal de que ela não vem pagando seus credores, cumprindo insatisfatoriamente o serviço vendido, etc.
Apesar de todos os cuidados, ainda ficamos expostos a situações como aquelas vividas pelos jovens formandos, acima mencionados. Empresas de grande renome do mercado também podem apresentar problemas financeiros, prejudicando clientes.
E, quando a situação chega a esse ponto, a via judicial pode ser a única esperança de solução.
Explica-se. É normal que uma empresa em estado financeiro precário não consiga cumprir todas as obrigações contratuais assumidas. Se não houver má-fé da empresa em querer lesar seus clientes, algumas obrigações ela vai cumprir, enquanto outras, serão descumpridas.
Se a situação financeira estiver ruim, faltará dinheiro para cumprir todas, mas algumas ela certamente cumprirá.
E é neste ponto que a medida judicial poderá ser a salvação de suas férias.
Se a agência de viagens não tem a intenção de lesar seus clientes, desviando os seus fundos e dilapidando seu patrimônio, aqueles clientes que se socorrerem do Poder Judiciário com maior celeridade certamente serão privilegiados se houver a necessidade de a empresa “escolher” quais pacotes de viagem serão ou não cumpridos.
Havendo receio de que determinada viagem possa não se concretizar por razões, por exemplo, de dificuldades financeiras da agência de viagem, o consumidor poderá pleitear por uma espécie de liminar, com fundamento no Código de Defesa do Consumidor, para obrigar a empresa a apresentar, previamente, os bilhetes aéreos e “vouchers” dos hotéis, para que o cliente possa viajar com mais tranquilidade e saber que a reserva aérea e terrestre está garantida.
Seja para obter medidas judiciais para trazer maiores garantias de que a viagem será realizada, seja para obter o reembolso dos valores despendidos com a aquisição dos pacotes de viagem, o judiciário se mostra como um grande aliado daqueles que adquiriram a tão sonhada viagem de férias/formatura e não têm mais certeza se conseguirão embarcar ou não.
Tudo isso sem mencionar que o judiciário será o único meio para ressarcimento dos danos que o descumprimento do contrato possa trazer (e certamente trará), tais como o dano moral.


Fabio Tadeu Ferreira Guedes é advogado e sócio do escritório Junqueira Gomide & Guedes Advogados Associados. fabio@junqueiragomide.com.br